Blog criado para o acompanhamento das actividades realizadas pelo TFA Teatro de Formas Animadas de Vila do Conde, e para o conhecimento, discussão e troca de experiências sobre todos os tipos de Formas Animadas: marionetas, máscaras, sombras, imagem manipulada, etc.

8/04/2006

PANDORA


“A Criança Eterna acompanha-me sempre.
A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando.
O meu ouvido atento alegremente a todos os sons
são as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas.”

Alberto Caeiro
In O Guardador de Rebanhos (v. VIII)


No ano lectivo 2005/2006, o TFA desenvolveu um trabalho de colaboração com a recém criada Escola Secundária Afonso Sanches de Vila do Conde, criando e orientando o grupo de teatro escolar. A experiência, orientada pelo encenador Marcelo Lafontana e a professora Sandra Cardoso, terminou no dia 9 de Junho passado, com a apresentação pública do espectáculo “Pandora”, que reuniu em palco a professora Sandra e uma dezena de dedicados actores-alunos, estudantes do 10º, 11º e 12º anos. Eis, a seguir, a transcrição da folha de sala da peça:

“Aprendemos sempre, ao longo de toda a nossa vida, numa ânsia desenfreada por saber mais, experimentar, evoluir e superar os nossos próprios limites. Esta será, provavelmente, a principal razão do nosso sucesso no mundo, e também a causa maior de todos os nossos males nele. Aprendemos às voltas com as nossas sensações, com os nossos erros e acertos, na relação que estabelecemos com os outros seres e com o meio envolvente. Nesse jogo vital, somos movidos pelo prazer da descoberta, alimentados por uma enorme e irresistível curiosidade.

Segundo a lenda grega de Pandora, a humanidade terá recebido duas dádivas divinas: de Prometeu veio o benefício do fogo, contra a vontade dos outros deuses, e de Zeus o malefício da curiosidade, como castigo pela afronta de tal poder. A curiosidade é o preço do fogo. Ao receber a caixa fechada, secreta e proibida, Pandora não é capaz de resistir à tentação de a abrir e, tal como a outra senhora – a Eva bíblica – entorna sobre a raça humana a consciência do bem e do mal, do prazer e da dor, da vida e da morte. E ainda bem!
Com os alunos da Escola D. Afonso Sanches, tive o privilégio de poder abrir novamente esta nova Caixa de Pandora, que é o teatro, e deixar escapar os anjos e demónios que fazem parte da nossa humanidade. Certa vez, ouvi o actor e escritor brasileiro Plínio Marcos dizer: “o teatro deve ser uma tribuna livre, onde se discutem os problemas dos homens”. É assim que eu compreendo este espaço de expressão artística, mas não é nada fácil chegar aí. Na nossa arte temos que mostrar-nos de uma forma muito límpida e honesta, abrir o coração ao público e expor as nossas ideias e emoções mais íntimas. Este processo, que começa no segredo do grupo de trabalho, envolve uma relação de grande confiança e cumplicidade entre todos, para além do aprendizado e a articulação de um vocabulário técnico, cénico, que será utilizado na composição do jogo dramático.
Meses depois, vem o encontro tão desejado com o espectador. Um frio na barriga... Estaremos prontos? Depois desses anos todos, posso afirmar que não. Nunca estaremos prontos. E é isso que importa: a incerteza, a expectativa que se cria, a adrenalina, uma aura de magia nos envolve a todos. Levantamos a tampa, e é a vontade que supera o medo, e nos faz entrar em cena. Depois são os aplausos e, ainda mais tarde, as conversas, críticas (que aprendemos a respeitar ou ignorar), as leituras pessoais partilhadas com os actores. E o vício instala-se, o tempo passa e a caixa fecha-se mais uma vez. Por pouco tempo: só até chegar uma nova Pandora. Sempre Pandora. Viva Pandora!”

8/03/2006

Teatro de Papel / Convidado de Pedra


O TFA, em co-produção com o TNSJ, realizou no dia 1 de Julho passado a pré-estreia do seu mais recente espectáculo: Teatro de Papel/Convidado de Pedra, no Salão Nobre do Centro Municipal de Juventude de Vila do Conde. Trata-se de um projecto realizado com o apoio do IA - Instituto das Artes, e que ficou classificado em segundo lugar no concurso nacional para o ano 2006. Depois desta primeira apresentação, a peça fez a sua estreia mundial no dia 8 de Julho, no Teatro Municipal S. Luiz, em Lisboa.

A partir do texto original de Tirso de Molina (1630), com tradução de José Coutinhas e encenação de Marcelo Lafontana, a peça constitui um projecto nómada e portátil, visando a conquista de novos públicos, a integração de novas linguagens e sugerindo o acesso do espectador a outros espectáculos teatrais. Este curioso armário barroco, espécie de contentor miniaturizado do modelo arquitectónico e programático do TNSJ, vocacionado para a itinerância, cumpre assim a sua função de descentralização ao percorrer os palcos nacionais.

Resumo da intriga

D.João, inveterado sedutor, conquista as mulheres, faz amor com elas e abandona-as logo após. Mulheres, sempre mulheres, num apetite insaciável de enganador-coleccionador. Plebeias e nobres. Uma destas descobre o logro (D.João faz-se passar pelo seu apaixonado primo). O pai acorre para vingar a honra perdida da filha. D.João, tão exímio na arte do duelo como na da conquista, mata o pai da seduzida. Um dia, a estátua de pedra que encima o sepulcro do nobre senhor anima-se... É o fantasma, o revenant, o pai da donzela que vem do outro mundo, pela vingança, buscar o sedutor
e o vai arrastar para o inferno como anunciam, à maneira dos coros trágicos, os músicos da companhia:
"E que o devedor não pense
que Deus castigo não traga;
o prazo sempre se vence
e a conta sempre se paga."

Próximas apresentações Teatro de Papel/Convidado de Pedra:
  • Dias 25, 26 e 27 de Setembro no TNSJ (para professores e programadores teatrais)
  • De 13 a 30 de Novembro no TNSJ (temporada estável)